Por Lucas Lopes | Blog Climatiza
11 de novembro de 2025
A Polícia Rodoviária Federal PRF apreende queijo sem refrigeração na tarde de segunda-feira (10/11) em Balsas, no sul do Maranhão. O flagrante aconteceu durante fiscalização na BR-230, quando agentes identificaram que a carga vinda de São Paulo com destino a Dom Pedro-MA estava sendo transportada em condições totalmente inadequadas, sem controle de temperatura e sem certificação sanitária, representando grave risco à saúde pública.
Segundo a Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Maranhão (AGED), além da ausência de refrigeração, os produtos não possuíam nota fiscal nem certificação sanitária exigida pela legislação. O transporte inadequado de alimentos perecíveis como laticínios configura crime contra as relações de consumo, previsto no artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990, com pena de detenção de dois a cinco anos ou multa.
O Que a Quebra da Cadeia de Frio Significa para Laticínios
A cadeia de frio é o conjunto de operações interdependentes que garantem a manutenção de temperatura controlada desde a produção até o consumo final de produtos perecíveis. Para laticínios como queijos, a legislação brasileira estabelece padrões rigorosos de conservação.
De acordo com a NBR 14701 da ABNT e resoluções da Anvisa, o transporte de laticínios deve ser realizado em veículos refrigerados capazes de manter temperatura entre 4°C e 7°C. A Portaria SVS/MS 326/1997 do Ministério da Saúde determina que empresas transportadoras devem ter instalações adequadas e sistemas de refrigeração com controle constante de temperatura.
Quando exposto a temperaturas ambiente, especialmente no clima quente do nordeste brasileiro, o queijo se torna ambiente ideal para proliferação acelerada de bactérias patogênicas. Microrganismos como Salmonella, Listeria monocytogenes e Staphylococcus aureus podem se multiplicar rapidamente, produzindo toxinas que causam intoxicações alimentares graves.
A exposição prolongada ao calor compromete não apenas a segurança microbiológica, mas também as características físico-químicas do produto, causando alterações na textura, separação de gordura, acidificação e desenvolvimento de odores e sabores desagradáveis.
Epidemia Silenciosa: Números Alarmantes no Maranhão
Este não é um caso isolado no estado. Dados da PRF revelam uma sequência preocupante de apreensões similares em 2025:
Junho: 560 kg de queijos e carnes transportados em isopores improvisados de Buriticupu para Timon, sem qualquer controle de temperatura.
Julho: 6 toneladas de queijo coalho armazenados em sacos reutilizados de adubo, ração animal e sal mineral, em Caxias. A carga foi totalmente inutilizada por estar imprópria para consumo.
Julho: Mais 4,7 toneladas de peixes também apreendidos em condições irregulares.
Apenas nesses três casos documentados, foram retirados de circulação mais de 11 toneladas de alimentos perecíveis transportados irregularmente. A recorrência desses flagrantes expõe uma prática sistemática que coloca em risco milhares de consumidores maranhenses.
A situação é ainda mais grave considerando que estes são apenas os casos detectados. Quantos produtos chegam efetivamente às mesas dos consumidores em condições inadequadas? A pergunta permanece sem resposta precisa, mas os números conhecidos já são alarmantes.
Análise Técnica: Por Que a Refrigeração é Inegociável
Como especialista em refrigeração com mais de 10 anos de experiência no setor HVAC-R, posso afirmar que o transporte de laticínios sem sistema de refrigeração não é apenas ilegal – é extremamente perigoso.
A temperatura é o fator mais crítico no controle microbiológico de alimentos perecíveis. Entre 5°C e 60°C encontra-se a “zona de perigo” onde bactérias se multiplicam exponencialmente. Um queijo mantido a 25°C (temperatura comum em dias quentes) pode ter sua carga bacteriana duplicada a cada 20-30 minutos.
Requisitos Técnicos Obrigatórios
Sistema de refrigeração mecânica: Caminhões frigoríficos devem ser equipados com unidades de refrigeração integradas capazes de manter temperaturas constantes entre 4°C e 7°C, independente da temperatura externa.
Isolamento térmico adequado: Compartimentos de carga revestidos com materiais isolantes de alta performance (poliuretano expandido com densidade mínima de 40 kg/m³) para evitar trocas térmicas com o ambiente.
Monitoramento contínuo: Sensores de temperatura com registro automático e sistemas de alarme para detectar qualquer variação fora da faixa segura.
Manutenção preventiva: Inspeções regulares do sistema de refrigeração, substituição de filtros, verificação de níveis de gás refrigerante e calibração de termostatos.
Comparação com Padrões Internacionais
A União Europeia, através do Regulamento (CE) nº 852/2004, estabelece que “a cadeia de frio não deve ser interrompida” e que temperaturas inadequadas que possam resultar em riscos à saúde são terminantemente proibidas. As penalidades incluem multas pesadas e interdição imediata do negócio.
Nos Estados Unidos, o FDA (Food and Drug Administration) exige que transportadores de alimentos perecíveis sigam o FSMA (Food Safety Modernization Act), com controles preventivos obrigatórios e rastreabilidade completa da cadeia de frio.
O Brasil possui legislação igualmente rigorosa, mas o desafio está na fiscalização e cumprimento efetivo das normas, especialmente em regiões mais distantes dos grandes centros.
Impactos Reais: Quem é Afetado por Essa Prática
Para Consumidores
Risco direto de intoxicação alimentar com sintomas que variam de desconfortos gastrointestinais leves até casos graves que exigem hospitalização. Populações vulneráveis (crianças, idosos, gestantes, imunodeprimidos) estão em risco ainda maior.
Para o Comércio Varejista
Estabelecimentos que inadvertidamente comercializam produtos transportados irregularmente podem sofrer sanções da Vigilância Sanitária, incluindo multas, apreensão de mercadorias e até interdição temporária.
Para Transportadores Regulares
Empresas que investem em frota refrigerada adequada e seguem todas as normas enfrentam concorrência desleal de transportadores irregulares que reduzem custos ignorando requisitos de segurança.
Para o Setor HVAC-R
A visibilidade desses casos reforça a importância dos profissionais de refrigeração e da manutenção adequada de equipamentos. Cada sistema de refrigeração em um caminhão frigorífico é uma barreira de proteção à saúde pública.
Orientações Práticas: O Que Cada Ator Deve Fazer

Para Técnicos e Instaladores de Refrigeração
☑ Realizar manutenção preventiva rigorosa em sistemas de refrigeração de transporte, seguindo cronograma trimestral no mínimo.
☑ Verificar registros de temperatura durante visitas técnicas e alertar clientes sobre qualquer irregularidade nos dados de monitoramento.
☑ Recomendar upgrade de equipamentos obsoletos que não conseguem manter temperatura estável ou não possuem sistemas de registro.
☑ Emitir laudos técnicos detalhados após cada manutenção, documentando condições de funcionamento e conformidade com normas.
☑ Capacitar-se continuamente sobre legislação atualizada e novas tecnologias em refrigeração para transporte.
Para Empresas Transportadoras
☑ Investir em frota adequada com sistemas de refrigeração certificados e em bom estado de conservação.
☑ Implementar programa de manutenção preventiva com registros documentados de todas as intervenções técnicas.
☑ Treinar motoristas sobre importância da cadeia de frio, operação correta dos sistemas e procedimentos em caso de falhas.
☑ Manter documentação completa incluindo certificados de vistoria, notas fiscais, certificações sanitárias e registros de temperatura.
☑ Estabelecer parceria com empresas especializadas em refrigeração para suporte técnico 24 horas.
Para Consumidores Finais
☑ Verificar condições de transporte ao presenciar entregas de laticínios – veículos devem ser refrigerados.
☑ Checar temperatura do produto ao receber em casa – deve estar gelado ao toque.
☑ Observar sinais de deterioração como alterações de cor, odor forte, textura alterada ou embalagem estufada.
☑ Denunciar irregularidades à Vigilância Sanitária local através dos canais oficiais.
☑ Exigir nota fiscal em todas as compras, garantindo rastreabilidade do produto.
Para Órgãos Fiscalizadores
☑ Intensificar fiscalização em rodovias com histórico de irregularidades, especialmente em rotas conhecidas de transporte de perecíveis.
☑ Realizar campanhas educativas junto a pequenos produtores e transportadores sobre requisitos legais e riscos da inadequação.
☑ Estabelecer parceria entre PRF, Vigilância Sanitária, AGED e outros órgãos para ação coordenada.
☑ Divulgar amplamente casos de apreensão para efeito educativo e coercitivo.
Cronograma de Ação Imediata
| Prazo | Ação Prioritária |
|---|---|
| 24 horas | Empresas de transporte devem verificar condições de toda frota refrigerada |
| 1 semana | Agendar manutenção preventiva de sistemas de refrigeração de veículos |
| 15 dias | Treinar ou retreinar motoristas sobre operação de equipamentos e importância da cadeia de frio |
| 30 dias | Revisar e atualizar procedimentos internos de controle de temperatura |
| Contínuo | Monitorar registros de temperatura de todas as viagens e arquivar documentação |
Recursos e Referências para Aprofundamento

Documentos Oficiais
NBR 14701/2002 (ABNT): Norma brasileira que regulamenta transporte de alimentos perecíveis refrigerados, com procedimentos e critérios de temperatura.
Portaria SVS/MS 326/1997: Estabelece requisitos técnicos para empresas da cadeia de frio, incluindo transporte e armazenamento.
RDC 216/2004 (Anvisa): Define Boas Práticas para serviços de alimentação, abrangendo recebimento, armazenagem e preparação.
Lei 8.137/1990 – Art. 7º, IX: Tipifica crimes contra as relações de consumo, incluindo transporte inadequado de alimentos.
Contatos Úteis
AGED-MA (Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Maranhão): Fiscalização e orientação sobre transporte de produtos de origem animal.
Vigilância Sanitária Municipal: Denúncias de irregularidades em estabelecimentos comerciais.
PRF (Polícia Rodoviária Federal): Telefone 191 para denúncias sobre transporte irregular em rodovias.
ABRAVA (Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento): Informações técnicas e capacitação profissional no setor HVAC-R.
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FAQ: Dúvidas Frequentes Sobre Transporte Refrigerado de Laticínios
Qual é a temperatura mínima exigida para transporte de queijos no Brasil?
A legislação brasileira estabelece que laticínios devem ser transportados em temperatura entre 4°C e 7°C durante todo o percurso. A Portaria CVS 5/2013 e a NBR 14701 determinam que veículos de transporte sejam equipados com sistemas de refrigeração capazes de manter essa faixa, independente da temperatura externa. Temperaturas acima de 10°C já representam risco de proliferação bacteriana acelerada.
Como identificar se um queijo foi transportado sem refrigeração adequada?
Observe sinais como textura alterada (muito mole ou ressecada), presença de mofo atípico, odor forte ou azedo, coloração diferente do padrão, embalagem estufada ou com condensação excessiva interna. Ao toque, o produto deve estar gelado. Se houver dúvida sobre as condições de transporte, é mais seguro não consumir e reportar ao estabelecimento vendedor.
Quais doenças podem ser causadas pelo consumo de queijo mal conservado?
O consumo de laticínios transportados sem refrigeração pode causar intoxicações alimentares por bactérias como Salmonella (febre tifoide), Listeria monocytogenes (listeriose, especialmente perigosa para gestantes), Staphylococcus aureus (intoxicação estafilocócica) e E. coli (infecções gastrointestinais graves). Sintomas incluem diarreia, vômitos, febre, dores abdominais e, em casos graves, podem levar à hospitalização.
Empresas pequenas também são obrigadas a ter veículos refrigerados?
Sim, a obrigatoriedade independe do porte da empresa. Qualquer transportador de alimentos perecíveis deve seguir as mesmas normas de segurança alimentar. Pequenos transportadores podem optar por veículos refrigerados menores ou até containers isotérmicos com gelo reciclável para trajetos muito curtos (até 2 horas), desde que comprovem manutenção da temperatura adequada durante todo o percurso.
Quanto custa equipar um veículo para transporte refrigerado adequado?
O investimento varia conforme tamanho e tecnologia. Um baú refrigerado para veículo pequeno (tipo van) custa entre R$ 25.000 e R$ 45.000 instalado. Para caminhões maiores, o valor pode chegar a R$ 80.000 a R$ 150.000. Há também opção de locação de veículos refrigerados, com diárias entre R$ 300 e R$ 800 dependendo da capacidade. O custo de manutenção mensal médio fica entre R$ 500 e R$ 1.500.
O que fazer ao presenciar transporte irregular de alimentos perecíveis?
Anote a placa do veículo, horário, local e características da irregularidade (ausência de refrigeração visível, produtos expostos ao sol, etc.). Denuncie à PRF pelo telefone 191 se em rodovia federal, ou à Vigilância Sanitária municipal se em área urbana. Fotografe se possível, mas sem se expor a riscos. Sua denúncia pode evitar que produtos impróprios cheguem ao consumidor final.
Conclusão: Refrigeração é Investimento em Saúde Pública
A apreensão de 750 kg de queijo sem refrigeração no Maranhão não é apenas mais uma estatística – é um alerta vermelho sobre práticas que colocam vidas em risco diariamente. Como profissionais do setor HVAC-R, temos responsabilidade técnica e ética em garantir que sistemas de refrigeração funcionem adequadamente.
A cadeia de frio não é opcional nem negociável para transporte de laticínios. É questão de saúde pública, conformidade legal e compromisso com a segurança alimentar. O custo de um sistema de refrigeração adequado é infinitamente inferior ao preço de uma intoxicação alimentar coletiva ou de vidas comprometidas.
Cada técnico de refrigeração, cada empresa transportadora, cada fiscal e cada consumidor consciente é um elo nessa corrente de proteção. Quando um desses elos falha, todos estamos em risco.
O que você pensa sobre a fiscalização do transporte de alimentos perecíveis? Já presenciou situações irregulares? Compartilhe sua experiência nos comentários e ajude a conscientizar mais pessoas sobre a importância da refrigeração adequada.
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Lucas Lopes é jornalista especializado em HVAC-R com mais de 10 anos de experiência cobrindo o setor de refrigeração e climatização. Editor do Blog Climatiza, referência em informação técnica sobre ar condicionado e refrigeração no Brasil.



















3 comentários em “PRF Apreende Queijo Sem Refrigeração no MA: Alerta para Cadeia de Frio”
Great article highlighting the critical importance of maintaining the cold chain for food safety! This is such a vital issue, especially given the health risks involved.
Your technical breakdown made me think of another essential cold chain: transporting temperature-sensitive medications like insulin. The principles of constant temperature monitoring and using proper insulated packaging seem very similar.
I’m curious, from your HVAC-R expertise, what are the key technical differences between the refrigeration systems required for a truck transporting food, like cheese, versus a portable medical cooler designed for pharmaceuticals? Are the compressors, insulation standards, or temperature control mechanisms fundamentally different, or do they operate on the same core principles? I ask because I recently read a detailed guide on the specific requirements for transporting insulin and other refrigerated meds here: https://pillintrip.com/fr/article/how-to-transport-insulin-and-other-medications-that-require-refrigeration (Apologies for the link, but it provides a clear reference point for what I’m asking about).
Thanks for sharing such an informative piece!
fhujgh